Sorrisos Apaixonados - Um Doce Cliche

Um Doce Clichê: O Primeiro Encontro com Cheiro de Canela

Capítulo 2

Alguns dias depois da (quase trágica, porém inesquecível) festa de Luísa, Lucas estava deitado no sofá com um livro aberto no colo e o celular em modo “não perturbe” — o que, convenhamos, era um nome otimista demais para alguém que verificava o aparelho a cada cinco minutos.

Então, como se o universo tivesse escutado seu desejo mais secreto (e com certeza mais brega), o telefone vibrou. Na tela, uma notificação inesperada:

Rafael:
“Ainda pensando no nosso desastre com o bolo da Lu. Que tal colocarmos as habilidades à prova de novo? Café e bolo (inteiro desta vez) amanhã?”

Lucas, que já vinha sonhando com esse convite desde o minuto em que Rafael sorriu entre os coloridos glacês, respondeu quase instantaneamente:

Lucas:
“Só se o bolo vier com seguro contra acidentes. Me diga onde e quando.”

E assim ficou marcado: sábado, às cinco da tarde, em uma cafeteria charmosa escondida numa rua tranquila de Pinheiros, dessas que parecem ter saído direto de um filme francês — luzes pendentes amareladas, cadeiras de madeira com almofadas floridas e um cheiro constante de canela, bolo no forno e café passado na hora.

Lucas chegou primeiro — é claro. Como professor, ele levava a pontualidade a sério, quase como se fosse parte do currículo escolar. Escolheu uma mesa próxima da janela, onde a luz do entardecer pintava o chão de ladrilhos com tons quentinhos, tipo filtro de Instagram, só que de verdade.

Sentado ali, ele passou os olhos pelo cardápio, embora soubesse que pediria bolo de cenoura com cobertura de chocolate. A escolha não era gastronômica — era emocional. Em sua mente veio uma lembrança doce do desastre compartilhado. E com ela um sorriso se formou em seu rosto.

Poucos minutos depois, Rafael entrou. Usava uma camisa azul claro, as mangas dobradas nos antebraços e um sorriso que parecia tropeçar entre o charme e o nervosismo — o que, para Lucas, era basicamente irresistível. Trazia nas mãos um potinho de vidro cheio de brigadeiros caseiros, enfeitados com granulados coloridos.

— Não sabia se trazia um bolo ou se seria um trauma — disse ele, estendendo o pote com ares de oferenda sagrada. — Mas pensei: chocolate sempre ajuda.

Lucas pegou um brigadeiro, tentando não parecer muito encantado.

— Você está tentando me comprar com açúcar?
— Está funcionando — respondeu ele mesmo, já com a boca cheia.

Eles riram e pediram dois cafés e uma fatia generosa do tal bolo de cenoura. Dividiram tudo como quem divide a vida a muito tempo: sem pressa. A ideia era um encontro leve, casual. Nada demais. Mas logo perceberam que estavam dois passos adiantados na dança do “primeiro encontro”. Conversaram como velhos conhecidos que finalmente se deram conta de que queriam ser mais do que isso.

Falaram da infância, de medos bobos, de paixões absurdas. Lucas descreveu suas aulas — cheias de adolescentes hiperativos, perguntas sobre o Egito Antigo e teorias da conspiração envolvendo múmias e alienígenas. Rafael confessou sua obsessão por tipografia e o estranho hábito de julgar cardápios mais pelo design do que pelas opções do dia.

— Eu soube que você tinha um talento especial quando te vi organizando os cupcakes da Luísa por cor — disse Lucas, girando a colher no café como quem mexe uma lembrança boa. — Aquilo foi TOC ou talento?

— Um pouco dos dois — respondeu Rafael, piscando com um exagero dramático digno de novela.

O tempo, como costuma fazer nessas ocasiões, decidiu passar depressa. Quando perceberam, o céu já estava tingido de azul profundo, e o garçom avisava, com a educação de quem vê cenas fofas demais para interromper, que o local fecharia em vinte minutos.

Na calçada, o vento de fim de outono fazia as folhas dançarem devagar, como num clipe romântico em câmera lenta. Lucas encolheu os ombros no casaco, e Rafael, por reflexo, se aproximou um pouco mais.

— Sabe… — disse Rafael, hesitante, como quem está prestes a pular de um trampolim emocional — acho que a melhor parte daquele bolo ter caído foi que ele me fez te conhecer.

Lucas riu, surpreso e tocado, e deu um passo mais perto, com um olhar provocativo:

— Isso foi uma declaração ou uma ameaça pra confeitaria?

— Os dois. Definitivamente os dois.

E então, com cheiro de café e canela ainda no ar, brigadeiros esquecidos nos bolsos do casaco e corações batendo um pouco mais rápido do que o normal, eles se abraçaram. Um abraço longo, quase indecente para duas pessoas que, tecnicamente, mal se conheciam.

Mas quando Lucas se afastou só o suficiente para olhar Rafael nos olhos, o mundo pareceu parar e ele segurou o fôlego por um segundo. E naquele segundo, tudo ficou simples — como se a cidade ao redor tivesse silenciado só para ouvir o som de dois corações dizendo “sim”.

Rafael sorriu, tímido. Lucas retribuiu. E então, quase como se estivessem se inclinando para uma confidência, seus rostos se aproximaram devagar, devagarinho… até que os lábios se encontraram num beijo breve, mas cheio de promessas.

Um beijo suave, do tipo que não grita, só sussurra:
“Quero mais disso.”
“Você também sentiu?”
“Talvez a gente tenha mesmo se encontrado no lugar certo.”

Eles se afastaram, sorrindo como alguém que acabou de descobrir um segredo delicioso, e seguiram caminhando lado a lado, sem pressa — com brigadeiro no bolso, bolo na lembrança e um beijo guardado no coração.

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